sexta-feira, 26 de março de 2010

Pela palavra pode ganhar-se voz social

Hoje estamos em Beringel . Estacionados numa fresca sombra de um jardim, vemos surgir três pequenas figuras, com os cabelos desalinhados pelo vento, carregando às costas mochilas.

Alexandra, Maria do Carmo e Sebastião, surgem curiosos e cheios de perguntas.
- Isto é uma biblioteca?
- Podemos entrar?
- Podemos mexer nos livros?
Acolhemo-los no interior da Biblioteca Andarilha e satisfazemos a sua sede de tocar e descobrir .
São meninos de etnia cigana e tocam com a ponta dos dedos os livros de animais com texturas. Lêem com as mãos, com os olhos, com o corpo que se agita sôfrego de saber.
Ao golfinho chamam foca. Ao lagarto chamam dragão.
Se continuarem a aparecer, aprenderam outras palavras e com elas designarão outros mundos.
Perguntamos-lhe se querem ouvir uma história e logo nos dizem que sim.
Observam e escutam as palavras da Lénia com os olhos arregalados e cintilantes, um sorriso desenhado no rosto. Tem sede de atenção e de conhecimento.
Três histórias ouviram mas ouviriam mil, os seus corpos estão quietos e nos olhos o espanto mostra que viagem pelos livros, pelas palavras, pelas imagens pode ser serena .
Depois das histórias a Lénia pergunta-lhes o que querem ser quando forem crescidos.
- Eu quero tirar a carta, diz Alexandra.
- Mas ter carta não é profissão Alexandra. Diz-me lá é o que queres ser quando fores grande. Fica em silêncio a pensar nessa coisa profissão que talvez não saiba o que significa. Maria do Carmo, a mais velha dos três, responde:
- Gostava de ser polícia ou advogada, para poder prender ou tirar da prisão.
Marcados pela pobreza, pela desconfiança, pela exclusão vivem em sonhos o poder ter autoridade.
Ali, na biblioteca largo, todos os sonhos são possíveis.
Ali, pela palavra pode ganhar-se voz  social.
Nelson Migueis - Estagiário de Animação Sócio Cultural



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